Boa tarde!
Entrem, entrem, vão-se instalando. Se for preciso arranjo mais cadeiras, é só dizer!
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Sempre que volto a uma folha em branco, a sensação que tenho é a de me estar a encontrar com pessoas curiosas, bem humoradas e com vontade em questionar quase tudo. Por regra, esta ideia ajuda-me a retirar pressão sobre a existência de uma audiência feroz e implacável do outro lado. Aliás, desse lado. A verdade é que penso pouco na possibilidade dessa existência até porque o grupo que tem seguido a maybe not tem sido sempre muito restrito e costuma ter algum conhecimento prévio sobre quem sou, com maior ou menor detalhe.
Nos últimos dias, no entanto, fui surpreendida com a subscrição inesperada de cerca de 30 pessoas que não conheço, o que torna a tarefa de começar a newsletter de hoje muito mais desafiante: olá pessoas novas, olá medo, olá resistência! Tudo porque a Mafalda, que não sendo minha amiga, se está a tornar numa pessoa com quem é fácil falar e partilhar pontos de vista (o início de qualquer amizade, não?), decidiu “recomendar” a maybe not junto das pessoas que a seguem. O resultado foi praticamente imediato, fiquei pasmada. Em conversa, falávamos sobre esta necessidade de combater a dúvida e avançar com os nossos projetos ou divulgá-los para que também os outros o possam ver, elevar. É um compromisso conjunto.
“É que podes mesmo fazer uma coisa boa e bonita com isto, mesmo que a insegurança tente sempre ganhar a melhor de ti. faz parte, mas não deixes que seja o todo.”
A Mafalda tem razão e eu sei disso. O que é que me deixa tão relutante?
As cadeiras acima representam o número de subscrições atuais desta newsletter e se parte de mim fica extremamente feliz e confiante com a plateia, a outra fica razoavelmente curiosa e defensiva em relação à forma como devo interpretar a realidade dessas cadeiras. Sendo-vos sincera, com o lado mais feliz sei eu lidar, mas isso sabemos todos. A chatice nasce quase sempre do lado que incomoda e que pende normalmente para a dúvida e para a insegurança.
Questiono-me muitas vezes sobre qual o sentido desta newsletter. “Porque é que estou a fazer isto?”. Na maioria das vezes corroboro a intenção e congratulo-me por ainda não ter desistido, mas outras, mais do que aquelas que gostaria de admitir, sinto-me refém da questão e do silêncio que a sucede. Isto acontece tanto com a maybe not como com outros projetos de vida.
“Porque é que decidi fazer isto?” é um bom indicador para analisar as motivações que nos levam a agir de determinada maneira. No que diz respeito a esta newsletter, posso tentar descrever o que faço da seguinte forma: escrevo geralmente sobre temas que me interessam genuinamente, faço-o com prazer e tento ser o mais franca possível. Falho muitas vezes, mas a tentativa é palpável e isso dá-me esperança.
Ter novas cadeiras significa ter novas pessoas, com histórias diferentes e expectativas desconhecidas, possivelmente com um julgamento alheio ao que estou habituada por parte das pessoas que já seguem este espaço há mais tempo. Eu lido bem com o número de cadeiras a aumentar e é aqui que quero chegar. Não só lido bem como quero, pela força da circunstância, ser forçada a encomendar um carregamento extra de cadeiras para o futuro mais próximo. Sinto que este espaço só pode ser relevante se se mantiver em constante mutação e isso só é possível com a energia e a vontade da novidade, minha e de quem lê, queira isso dizer que há pessoas que concordam ou discordam, que gostam ou repudiam os caminhos por onde me vou perdendo.
Então qual é afinal o sentido da minha cisma, o que vos posso dizer?
Sou culpada. Sou culpada porque me distraio e não consigo terminar ou começar uma frase. Sou culpada por falar em excesso e perceber que me estou a perder nos meus pensamentos. Sou culpada por pensar demais e escrever pouco. Sou culpada por comer torradas com azeite e oregãos e sujar o sofá com migalhas. Sou culpada por deixar tarefas importantes para os últimos minutos. Sou culpada por ser mimada. Sou culpada por ser arrogante quando me sinto magoada. Sou culpada por ser demasiado orgulhosa para reconhecer que estou a ser orgulhosa. Sou culpada por negligenciar os meus sonhos e ajudar os outros a alcançarem os deles. Sou culpada por responder demasiado tarde às mensagens que me mandam. Sou culpada por existir. Sou culpada por ter um corpo que tem necessidades. Sou culpada por me sentir culpada, mas acima de tudo, sou culpada por evitar o atrito da interação com a vida.
O atrito, cientificamente falando (vamos lá ver se ainda me lembro das aulas de Física do secundário!), é uma força que surge quando há contacto entre duas superfícies sólidas.
Lembro-me de ser pequena e ter o hábito, para mal dos pecados da minha mãe, de reorganizar a disposição dos móveis do quarto sempre que me apetecia. Lembro-me também que a mobília era terrivelmente pesada, em madeira maciça (muito old fashioned para quarto de crianças, sim) e sempre que tentava empurrar o guarda-roupa ou a cómoda, a força que imprimia parecia ser recebida pelos objetos inanimados com resistência. Nada se mexia à exceção dos meus pés, que escorregavam transpirados no chão. Neste caso, do confronto entre o meu corpo e o guarda-roupa nascia o tal atrito, a força capaz de manter o móvel no sítio e dificultar o seu movimento. Eventualmente, e ao fim de algum esforço, lá conseguia arrastar o móvel e superar a força de atrito do móvel e uma vez que essa primeira fase estivesse concluída, o resto tornava-se muito mais fácil, até porque os objetos em movimento são muito mais fáceis de mover. Num instante o quarto estava mudado. Sucesso!
Se numa primeira análise poderíamos julgar que o atrito é esta coisa chata, responsável por criar resistências e situações de remodelação falhada, o facto é que sem ele não poderíamos fazer coisas tão simples e vitais como andar ou segurar objetos, os carros não se movimentariam. O atrito é uma das forças que nos permite existir no mundo e meio que precisamos que ele exista.
O atrito pode desacelerar as coisas e impedir que objetos estáticos se comecem a mover. Num mundo sem atrito teríamos caos: os objetos deslizariam, teríamos dificuldade em guardar coisas e seria quase impossível, tanto para as pessoas como para os carros deslocarem-se ou mudarem de direção.
É um cenário que tem tanto de peculiar como de cómico, mas o atrito tem a sua razão de ser e isso basta para existir. Só este exemplo deveria ser o suficiente para me relembrar em ser mais considerativa com esta força, até porque, além de me ter ajudado a ganhar músculo enquanto tratava das mudanças no quarto, também me mostrou que o atrito surge de formas semelhantes nas interações humanas e que isso pode ser benéfico para me fazer continuar.
Quando estamos bem, tudo à nossa volta está bem. Não há espaço para o constrangimento. Pelo contrário, quando o inesperado nos coloca em situações de conflito, o atrito aparece e nada parece correr de acordo. Suponho que já tenham sentido isto, ou na interação com pessoas que não conheciam tão bem, ou em momentos de confronto com determinadas questões que vos inquietaram ou vos deixaram desconfortáveis.
Regressando às cadeiras. Ter 100 subscritores não é nada, no grande esquema das coisas e do chamado “alcance”. Ainda assim, pensar que posso ter 60% das 100 cadeiras ocupadas, atentas ao que escrevo e às ideias que vou partilhando é o reflexo de um certo confronto entre duas superfícies sólidas: eu e um conjunto de cadeiras que não só não são inanimadas como têm opinião.
O mundo com atrito é tão responsável por desgastar a sola dos meus ténis, como por me permitir caminhar e esta associação deveria ser o suficiente para me fazer seguir em frente. Quem sou eu nesta história: o guarda-roupa, o meu corpo ou o atrito?
Estou a tentar criar algo através desta newsletter, mas há sempre uma força que me impele a não fazer, por cautela, medo ou insegurança. Um clássico! O estranho em tudo isto é que sei que uma vez que forçasse esta resistência parva, as coisas avançariam a um ritmo muito mais célere, as pessoas poderiam conhecer-me e ter uma outra ideia de mim, mais completa ou mais dada.
Eu sou estas coisas todas. Por algum motivo não consigo é chegar a mais cadeiras, simplesmente porque o atrito não é só uma força que faz com que exista como também sou eu. Vive em mim, quase como uma forma de digerir o que está à minha volta, ajuda-me a ter calma e a ser paciente, em ser racional e disciplinada. Esta é a dança do atrito, muitas vezes faz com que digamos ou façamos coisas patetas ou que não as façamos de todo. Todas as opções exigem coragem e no fundo só tenho de ser capaz de assumir um dos caminhos.
Entendam que esta é apenas e mais uma reflexão aberta a sugestões, a reconsiderações, nada do que digo aqui é estanque. Tal como eu, também as minhas palavras, atitudes e opiniões mudam e não há nada de errado nisso, aliás, em bom nome do crescimento e da propulsão, o recomendado é que o façamos. Avançar, aceitando o atrito ou pelo menos reconhecendo-lhe os devidos créditos!
O atrito existe para facilitar a nossa vida. Pode gerar alguns constrangimentos, mas se não o fizesse seria tudo muito mais aborrecido e pouco proveitoso (até porque não poderíamos andar ou mudar de direção?). Sem atrito, nem sequer poderia escrever a newsletter deste domingo.
Tal como com os nossos projetos, também as nossas relações enfrentam situações de atrito e isso não tem de ser um mau sinal. Os nossos conflitos são essenciais para nos mostrar por onde podemos crescer, o que precisamos de ultrapassar. Sem conflito ou sem atrito não sentiríamos prazer nem teríamos a mesma consciência sobre o nosso crescimento. O processo criativo de trabalhar sobre o conflito é o que nos dá poder e reforça a compreensão do mundo.
O atrito opõe-se ao facilitismo e curiosamente age como catalisador, mesmo que não o consigamos testemunhar. É que nos dias que correm parecemos ser cada vez mais adeptos de uma sequência rotineira de passos que não nos obrigue a lidar com dificuldade, emoções, pessoas, dúvidas que nos atrasam. Pelo contrário, sem atrito pararíamos e acredito mesmo que é este “atraso” que acaba por nos fazer chegar a horas aos momentos mais importantes da nossa vida.
Ok, talvez seja a altura indicada para reconhecer que o atrito é importante na minha vida, que é útil e provavelmente existe para tornar a vida mais fácil. Só não posso deixar que tome conta dos meus sonhos.
Continuo a sentir-me culpada por não me mexer. O lado bom é que o tempo e o silêncio são exímios a mostrar que não há problema em não termos respostas para as coisas indecifráveis, em sermos atrito até que o movimento dê de si em nós.
É istoooo. Hurray atrito, hurray.
adeuuuuus ❤️
A Tribe Called Quest, um dos sons da semana!
Um jota em analógico.
Amor em analógico.
How When Harry Met Sally Used Physical Spacing to Tell Its Love Story. Um artigo sobre um filme que quero muito ver!
Nunca tinha feito uma manicure. Aos 26 anos fiz isto. Estes anos todos estive a perder um mundo infinito de possibilidades de cor nas unhas? Não sei se me vou habituar, mas cá vai. Um highlight da semana, sem sombra de dúvida.
A Manifesto by Ai Weiwei — The artist’s 10 rules for life and creativity. Adoro as sugestões do WeTransfer enquanto estou a trabalhar.
Sonhar com Dua Lipa e com o Primavera durante a semana inteira!!!!!!!!
A terceira temporada de Amiga Genial na HBO e a banda sonora do Max Richter.
Meet Mina Le, the YouTuber making fashion history more accessible. Uma entrevista a uma das minhas YouTubers favoritas:
“Le’s love of history ties together her breadth of content. She manages to pinpoint historical parallels to idiosyncratic cultural phenomena that may seem unique to the 21st century. One video about TikTok rehashing the 2010s Tumblr girl aesthetic tied social media’s adoration of tragic women to Aristotle and Edgar Allen Poe. Another about the increasingly popular “old money aesthetic” looked back at the Kennedys and the fashion of early collegiates in the Seven Sisters, a group of elite, historically women’s colleges that includes Vassar and Barnard. Fashion history acts as a powerful lens connecting two seemingly distinct time periods. Le’s videos are often at their best when they harness this power and read between the lines of cyclical trends, such as corsets, that seem to always reappear as reinvented versions of their former selves.”It’s a mood!
Vemo-nos para a semana?
Aceitem o atrito, vou tentar fazer o mesmo!
M.